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terça-feira, 9 de setembro de 2014

AERODINÂMICA SOBRE RODAS – PARTE 2




Na primeira parte deste artigo vimos a evolução da aerodinâmica automobilística, em especial nas pistas de corrida, o surgimento dos primeiros apêndices aerodinâmicos e de como eles controlavam a estabilidade do carro e como geravam downforce para as rodas.

O grande passo seguinte ocorreu por acaso. Peter Wright era ainda estudante, mas estava avaliando certas dificuldades e opções com o Lotus 77. Ele tinha começado a estudar o uso de radiadores de superfície, instalados na face externa de grandes bolsões laterais (side pods) do carro. Para isso ele estava usando um túnel de vento com esteira móvel, imitando a passagem do piso, sob o modelo em escala. Uma novidade revolucionária para a época.

Entretanto, ele teve alguns problemas. Os resultados da instrumentação não se repetiam nem eram consistentes. Um exame do modelo mostrou que sob os efeitos do vento, os bolsões laterais haviam arqueado, e que quanto mais as laterais do bolsão se aproximavam da pista, maior era a downforce. Ele então recurvou ainda mais os bolsões e estendeu suas laterais até o piso, e a downforce dobrou.

A descoberta mostrou não só a importância do perfil de asa invertido, como da vedação das laterais do carro junto ao piso. Esta vedação indiretamente remetia às vedações de Lexan do Chaparral 2j, mantendo a lateral do carro completamente selada, mesmo com as irregularidades do piso. Daí surgiu o conceito de carro-asa.

Peter Wright desenhou o Lotus 78 baseado neste conceito.



Perfis de asa invertida das Lotus 78 e 79

Sob os bolsões laterais, o Lótus 78 possuía um perfil de asa de avião invertida, de forma que o ar frontal que entrava por baixo dos bolsões ficava confinado, e a passagem de ar ia se restringindo, obrigando o ar a acelerar. Assim como num venturi de carburador, essa aceleração do fluxo de ar reduzia a pressão sob o carro, gerando downforce.

Enquanto isso, as laterais dos bolsões e as minissaias, chapas verticais deslizantes que constantemente tocavam o solo, separavam o ar a baixa pressão sob o carro do ar atmosférico, evitando que esse ar adicional entrasse por baixo do carro pelas laterais e anulasse o efeito asa.

Embora o Lotus 78 tenha vencido quatro corridas em 1977, várias dificuldades não ofereceram qualquer oportunidade para ele ser realmente competitivo. Mas a real vantagem técnica do carro passou completamente despercebida pelas outras equipes.

Um dos problemas com o Lotus 78 era que seu centro de pressão estava muito à frente, obrigando o ajuste do aerofólio traseiro sempre com forte ângulo de ataque para gerar downforce suficiente para as rodas traseiras, o que aumentava muito o arrasto do carro e o tornava lento.

Em 1978, no entanto, surgiu o Lotus 79, que corrigiu este e outros defeitos, e redefiniu em apenas um ano todos os conceitos de aerodinâmica aplicados a carros de corrida.

Fato curioso é que para evitar que as outras equipes descobrissem o segredo do carro-asa quando o Lotus 79 se mostrou imensamente superior aos demais, Colin Chapman e toda equipe Lotus ensaiaram uma pantomima em declarações e atitudes, dando a entender que a grande vantagem técnica do carro estava no diferencial. Até mesmo cobrir rapidamente o diferencial com um pano a cada parada do carro era feito para desviar a atenção. E em hipótese alguma o carro era movimentado de forma a exibir seu lado de baixo a olhos e câmeras curiosos.

Essa pantomima deixou concorrentes e jornalistas atônitos. Que vantagem tão grande a Lotus poderia ter descoberto no princípio de um mero diferencial que eles próprios nem imaginavam?


Lotus 78 exibindo o espaço e as minissaias de vedação pressionadas contra o solo

Apesar de altamente competitivos, os carros-asa não eram fáceis ou seguros ao pilotar.
Em seu livro “A Arte de Pilotar”, Emerson Fittipaldi nos dá um depoimento em primeira pessoa das impressões de dirigir um carro-asa em condições de competição:

“...A grande mudança na maneira de dirigir veio em 77, 78 e 79, quando Colin Chapman iniciou a revolução do "efeito-solo" com as Lotus 78 e 79. Eu tenho que admitir que o período que se seguiu tornou necessários pilotos mais corajosos, até que o efeito-solo sem restrições fosse proibido na F-l em 1982. Você entrava nas curvas muito mais rápido que antes, mas ninguém esperava que você colocasse de lado um carro-asa. Foram os tempos das laterais deslizantes, as "minissaias", que criavam uma área selada entre o fundo do carro e a pista. As saias se movimentavam para cima e para baixo, por dentro das laterais da carroceria.

Um sistema de molas e roletas mantinha as saias pressionadas contra a superfície da pista o tempo todo e não havia vazamentos no vácuo que se criava embaixo do carro. Então, era necessário andar como se fosse sobre trilhos, porque os aerofólios, as asas dianteiras e a aerodinâmica que havia por baixo do carro deixariam de operar e se perderia quase toda a pressão se o carro estivesse de lado.

O mesmo ocorre com o F-1e os Indycars de hoje, mas naquela época era muito mais crítico manter o carro em linha reta. A técnica era entrar na curva tão rápido quanto você podia, tentando manter o carro equilibrado durante todo o percurso. Você tinha que dar gás logo, mas não deixar o carro deslizar de jeito nenhum. Devido a toda a pressão e à sucção, havia muita carga aerodinâmica no eixo dianteiro e a direção era muito pesada. Os carros geravam tanta força para baixo e tinham uma baixa pressão tão fenomenal embaixo deles, que não havia maneira nenhuma de você sentir ou ser avisado quando o carro começava a derrapar. Quando você percebia, ele já tinha ido embora!

Para mim, não havia prazer em pilotar desse jeito. Todos os pilotos, penso eu, estavam perdendo seu estilo. O carro é que ditava a maneira de guiar. O carro é que estava no comando, no lugar do piloto. O piloto tinha de se adaptar ao que o carro queria fazer, nunca o contrário. Se o carro saísse de controle, havia pouca ou nenhuma chance de corrigir. E havia muita diferença de desempenho entre os carros. Um bom piloto não podia fazer nada para um carro ruim andar melhor.

Naqueles carros, o piloto não podia sentir o escorregar dos pneus em relação à pista. Os pilotos "sentem" o carro por estes movimentos e, se esta referência não existir, sua tarefa fica muito mais difícil. Esta era uma das razões por que esses carros não davam aviso prévio. Em um determinado momento, você estava colado no chão e, no instante seguinte, virava passageiro do carro, sem a menor chance de recuperação.

Eu detestei guiar os carros-asa. Na minha opinião, foi uma época em que a F-l começou a se deteriorar e, se você fosse dono ou chefe de uma equipe, não saberia qual piloto contratar se observasse seu desempenho nas curvas. Era impossível ver qualquer traço de técnica ou refinamento. Você poderia ver alguma exibição de machismo por um ou dois pilotos, mas, em geral, todos se pareciam. Era difícil dizer quem andava rápido e por que razão. Havia quatro ou cinco pilotos reconhecidos, que todo mundo sabia que eram de primeira linha, mas era impossível avaliar os novos pilotos que apareciam.

Sem dúvida nenhuma, esta foi a maior mudança que experimentei em toda a minha carreira de piloto. Lembro um bom exemplo de como se guiavam esses carros, nos treinos para o GP da Alemanha, em Hockenheim, em 1980. Todo mundo estava fazendo a curva de alta da parte de trás do circuito mais rápido que antes. Em cada volta, eu chegava na curva mais e mais rápido e ficava me perguntando: "E se eu fizer a curva de pé embaixo? Será que o carro agüenta?" Em uma volta eu fiz a curva quase flat. Fiz mais uma da mesma maneira. A partir daí, como se fosse mágica, eu fazia a curva com o pé no fundo, sem a menor hesitação. Mas não havia reação no carro, nada acontecia. Era meio apavorante. A diferença entre andar sobre trilhos sem problemas e voar para fora da pista era muito estreita. Eu voltei aos boxes e perguntei a Keke Rosberg, que era meu companheiro de equipe e, sem dúvida, um piloto muito corajoso, como ele estava fazendo a curva. Ele me respondeu que não estava acelerando tudo. E eu fiquei a me perguntar: "O que será que há de errado?"
Fiquei realmente muito contente quando, depois que abandonei a F-l, os carros-asa e as minissaias foram proibidos na F-l e na Indy. Há uma grande diferença na sensação que proporciona hoje um carro na Fórmula Indy e um carro-asa com efeito-solo integral daqueles tempos. Muitas vezes, eu tive problemas com as minissaias, que por alguma razão deixavam de deslizar, e sei de inúmeros pilotos que enfrentaram situações igualmente assustadoras. Se você chegasse numa curva como em Hockenheim, e uma das saias estivesse recolhida e não houvesse vedação entre o carro e a pista, você seguia reto – não havia nada para fazer. Pedaços de borracha ou detritos na pista podiam entortar as saias.

Se você tocasse numa "zebra" e a saia entortasse, na próxima curva iria descobrir que toda a pressão tinha ido embora e mais uma vez você sairia reto. O piloto estava sem nenhum controle sobre o que poderia acontecer.

Desde que as minissaias deslizantes foram abandonadas, os carros se tornaram muito melhores. Eles não são mais tão sensíveis a mudanças de ângulo em relação à trajetória e transmitem ao piloto sensações que tornam possível reagir a tempo, mesmo a velocidades acima de 300 km/h.

Logo a concorrência descobriu o “pulo do gato” da Lotus e começaram a fazer seus próprios carros-asa.

Entretanto, a Ferrari e a Brabham-Alfa Romeo usavam motores contrapostos de 12 cilindros, e estes motores largos tomavam o espaço necessário à formação dos perfis de asa invertida sob o carro, e por isso a eficiência do efeito solo dos seus projetos foi muito comprometida.

Este detalhe levaria a Ferrari ao começo de uma abstinência de títulos de mais de duas décadas, porém a Brabham apareceria com uma solução um tanto maliciosa.

Gordon Murray projetou o Brabham BT-46. Como em outros carros, ele instalaria um fundo plano, porém ainda manteria a parte do motor livre, pois ainda não se reconhecia a importância aerodinâmica daquela parte do carro.


Assoalho do Brabham BT-46

Para o Grande Prêmio da Suécia de 1978, ele projetou a primeira variação do carro, o BT-46B com um recurso “inovador”. Aproveitando parte da idéia original do Chaparral 2J, Gordon Murray instalou um enorme ventilador na traseira do BT-46B, acionado pela árvore primária do câmbio. Este ventilador sugava todo o ar dentro do compartimento do motor, e permitia que os radiadores do motor fossem instalados horizontalmente na parte superior da carenagem do motor e deixando a parte traseira do carro muito baixa.


Grande ventilador traseiro do BT-46B

Entretanto, Gordon Murray, como especialista em aerodinâmica, tiraria proveito do BT-46 ter um fundo plano com uma abertura sob o motor. Assim o ventilador não só sugaria o ar dos radiadores como também o ar sob o carro, gerando muita downforce.

Fluxo de ar do ventilador do Brabham BT-46B

Este carro venceu esta prova com Niki Lauda, com larga margem sobre os concorrentes e logo disparou uma enorme discussão, ante às reclamações das demais equipes.

A FIA ameaçou desclassificar o carro por uso de apêndice aerodinâmico móvel, proibido no regulamento havia quase 10 anos, mas Gordon Murray, usando de malícia, se defendeu, dizendo que o ventilador era parte essencial do sistema de refrigeração do motor.

Realmente, se o ventilador parasse, o motor sofreria rapidamente um superaquecimento e quebraria, pois naquela posição, os radiadores não eram eficientes com a passagem natural do ar por eles. Além disso, o ventilador sugava tanto ar de baixo como de cima do carro.

Sendo assim, não foi possível à FIA alegar que o ventilador possuía uma função aerodinâmica deliberada.

Politicagens pra cá, cartolagens pra lá (a Brabham pertencia a Bernnie Ecclestone nesta época), e ficou decidido que a vitória de Niki Lauda seria mantida, porém, sob a alegação de que o carro gerava muita turbulência que afetava os carros vindos de trás além da grande projeção de sujeira (as mesmas alegações usadas para banir o Chaparral 2J das pistas anos antes), o recurso do ventilador foi proibido.

Isto tornou o Brabham BT46B o carro de F-1 mais eficiente da história, com vitórias em 100% das provas que disputou.

Os carros asa continuaram evoluindo. A eficiência deles era tão alta que em muitas provas os carros dispensavam o aerofólio dianteiro


Brabham BT49 de Nelson Piquet

Entretanto, assim como vimos Emerson contar em seu depoimento, o desempenho dos carros não parava de crescer e o limite entre o desempenho máximo e um acidente foi se tornando cada vez mais estreito, até o ponto em que acidentes graves começaram a acontecer, culminados pela morte de Gilles Villeneuve.

A FIA decidiu então pela proibição do carro-asa, e pela adoção de um fundo plano.
Entretanto, ao invés de os progressos pararem. eles aceleraram.

O fundo plano permitia que uma lâmina muito fina de ar em relação à largura e ao comprimento do carro ficasse contida entre o assoalho e o piso da pista. Mesmo sem o uso de minissaias, sob alta velocidade o ar que entrava pelas laterais não seria suficiente rápido para anular completamente qualquer efeito aerodinâmico que fosse conseguido pelo fundo plano e largo.

Foi em cima deste parâmetro que os projetistas da F-1 passaram a trabalhar.

Em outras categorias, com regulamentos mais abertos, a proibição dos carros-asa levaram a um desenvolvimento diferente da F-1, com os carros usando fundos curvos.

Estes fundos curvos criavam estreitamentos da lâmina de ar em pontos específicos, junto ao eixo dianteiro e ao traseiro, fazendo as vezes de duas asas em seguida.




Curvatura ampliada do assoalho de um esporte-protótipo e perfil extrator

Porém, uma nova evolução surgiria: o perfil extrator.

O perfil extrator é um componente aerodinâmico que conecta a lâmina de ar confinado sob o carro com a zona de baixa pressão que surge atrás do carro. Ele também possui um conjunto de cercas que confina e direciona o fluxo, aumentando a eficiência do sistema mesmo com as variações de perfil do piso, evitando que o ar escoe de um lado para outro.

O efeito de sucção do ar sob o carro acelera o fluxo, abaixando a pressão e gerando downforce. Podemos dizer que, dentro de certos limites, o perfil extrator faz de forma passiva o que os ventiladores faziam ativamente no Chaparral 2J e no Brabham BT46B.



Assoalho plano com perfil extrator

Na F-1, o uso do assoalho plano junto com o perfil extrator conseguiu repor boa parte da downforce obtido nos antigos carros-asa. Entretanto, o sistema era tão mais eficiente quanto mais próximo o assoalho corresse junto ao piso.

Em uma das diversas teorias sobre o acidente fatal com Airton Senna, a distância ínfima entre o assoalho e o piso da pista é apontada como fator principal ou pelo menos agravante. Em várias filmagens nas voltas que antecederam o acidente, o carro de Senna é mostrado soltando fagulhas ao bater o assoalho contra o solo.

Esta tese é reforçada pelo grave acidente de Rubens Barrichello nos treinos da sexta e pela morte de Roland Ratzenberger nos treinos de sábado.

Nesta época, os projetistas mantinham os carros a poucos milímetros da pista, e numa batida contra o solo com o assoalho tão próximo, o fluxo de ar sob o carro poderia ser interrompido, fazendo cessar todo a downforce da parte baixa do carro, tirando o carro de controle e levando ao acidente. Esta desconfiança levou a F1 a uma nova mudança de regulamentos.

Hoje o fundo dos carros não é mais plano, mas escalonado. Sob o assoalho plano é instalada uma prancha de madeira fornecida pela FIA, com altura certificada, e que ao final de cada prova é medida e não pode ter sua espessura total diminuída além de certo limite. Além de criar um certo degrau sob o assoalho, o limite de desgaste obriga as equipes a manterem uma altura mínima do solo, aumentando a altura da lâmina de ar e facilitando a entrada de ar em pressão atmosférica pelas laterais.



Assoalho escalonado dos F-1 modernos

O efeito-solo continua existindo na F-1, mas está bastante reduzido em relação ao passado, e os desenhistas se desdobram para conseguir mais downforce em condições desfavoráveis.

Diferentes concepções de perfis extratores: busca pela máxima eficiência

Em 2006, os carros da F-1 começam a ostentar todo um complexo conjunto de apêndices aerodinâmicos, alguns bastante estranhos, e que seriam parcialmente proibidos pelo regulamento a partir de 2009.


Estranhos apêndices aerodinâmicos na F1
Ao lançar mão de soluções como estas, os projetistas estão sinalizando que já esgotaram todos os recursos para condicionar e direcionar o fluxo de ar pelo carro apenas pelo projeto adequado de aerofólios e carenagens.

Com a evolução da aerodinâmica e do desempenho dos carros de corrida de uma maneira geral, um novo fantasma de origem aerodinâmica começa a assombrar as pistas, e atende pelo termo “blow over”.

Sob o efeito do blow over, um carro "decola" da pista e faz um looping no ar.

Vamos entender como o blow over ocorre.

Quando um avião está para pousar, ele vem em velocidade e mantém a asa em forte ângulo de ataque em relação ao ar. Ao se aproximar bastante do solo, o ar frontal colhido pela asa fica contido e o ângulo de ataque da asa gera uma cunha de ar. O piloto sente isto como um aumento da capacidade de sustentação da asa pouco antes de tocar o solo.

Este é um tipo de efeito-solo diferente do usado pelo carro-asa.



Efeito-solo: confinamento do ar sob a asa gera sustentação adicional

Este mesmo efeito-solo foi aproveitado num veículo experimental russo da era da guerra fria, o Ekranoplan. Ele foi criado como um misto entre um avião e um barco, servindo de veículo para desembarque rápido de homens e blindados. O Ekranoplan voava a poucos metros da superfície da água em altíssima velocidade, usando o efeito de compressão do ar frontal para gerar sustentação. A intenção era criar um barco de transporte com a velocidade de um avião e que voasse abaixo do horizonte do radar.

Ekranoplan

Se este efeito consegue ser aproveitado positivamente em aeronaves, em automóveis de alto desempenho ele representa um grande risco.
Num automóvel, especialmente os de fundo plano, correndo em alta velocidade, se por qualquer motivo houver um levantamento da frente do carro, de forma a gerar um ângulo de ataque positivo em relação ao ar frontal, este ar sob alta pressão irá acunhar entre o carro e o piso da pista, gerando sustentação positiva e o carro literalmente decola fora de controle.

Este ângulo de ataque pode acontecer em função de uma batida no carro da frente, por exemplo.
É o que se especula como fator agravante do acidente fatal com Gilles Villeneuve ou na pirueta de Christian Fittipaldi na reta final de Monza . É um tipo muito grave de acidente.

Porém o blow over também pode ocorrer graças a uma instabilidade aerodinâmica. Voltemos à nossa figura que mostra os três principais efeitos aerodinâmicos sobre o carro.

Principais efeitos aerodinâmicos sobre um automóvel

Vimos que conforme o carro se move, forma-se um colchão de ar sob o carro que gera sustentação positiva (de baixo para cima) graças à turbulência e ao acunhamento da lâmina de ar, além de se mostrar muito consistente nas oscilações de distância entre o solo e o fundo do carro.

Vimos também que o ar que entra por baixo do carro vem de uma zona de alta pressão que gradativamente cai até atingir a zona de baixa pressão atrás do carro.

Por fim, também vimos que o perfil do carro funciona como uma asa de avião, gerando mais sustentação positiva.

Enfim, tudo colabora para que o carro sofra a perda de contato com o solo, e este efeito é mais sensível na frente do carro que atrás.

Num carro de corrida, o fluxo por baixo do carro é controlado para manter estes efeitos aerodinâmicos limitados e sob controle. Entretanto, este controle tem limites.

Se estes limites forem ultrapassados, o menor sopro de ar sob alta pressão por baixo do carro vai erguer a frente, permitindo que mais ar sob alta pressão entre, incrementando o ângulo de ataque. E quanto mais a frente levanta, mais o efeito de acunhamento do ar frontal se faz sentir e menor qualquer efeito solo que antes era obtido.

Numa espécie de “efeito Tostines” (o que os engenheiros chamam de realimentação positiva), a frente do carro se levanta sem controle.

O resultado é que o carro faz uma pirueta no ar, aparentemente vinda do nada, como ocorreu com os protótipos Mercedes CLR em Le Mans em 1999.
Esta pirueta é o chamado efeito blow over e que limita a velocidade dos carros.

Este efeito também é comumente visto em provas de motonáutica, onde o efeito solo e assoalhos planos são largamente usados.

Cada vez que o progresso tecnológico contorna as limitações e as velocidades crescem até próximo aos limites seguros, os regulamentos são mexidos para evitar novos acidentes.

Hoje o automobilismo de alto desempenho busca criar regulamentos que limitem as velocidades máximas dos carros para evitar o blow over e outros tipos de riscos. Se os carros estão correndo a 250 ou 350 km/h a diferença não é perceptível ao público, mas faz enorme diferença na segurança dos carros, dos pilotos e do público presente.

A história da aerodinâmica automobilística mostra que, quando determinados obstáculos são vencidos por soluções técnicas inovadoras, os limites são estendidos, expondo novos obstáculos e perigos.

O blow over é exatamente este caso. É um acidente característico de veículos de assoalho largo e plano.

Avanço tecnológico tem seu preço. Com aerofólios, defletores, fundos planos e perfis extratores jamais voltaremos a ver carros de alto desempenho saltando estáveis e seguros em ondulações de pista como nesta foto com Jack Stewart seguido por Graham Hill, em Nürburgring.


Os BRM de Jackie Stewart e Graham Hill no ar (foruns.wwortex.com)

Romantismo e alta tecnologia geralmente não se misturam. A menos que tecnologia seja sua paixão.

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