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segunda-feira, 1 de dezembro de 2014

UM POUCO DA VERDADEIRA HISTÓRIA DA INDÚSTRIA AUTOMOBILISTICA BRASILEIRA



A Vemag e seus modelos DKW produzidos no Brasil Quem passa hoje pelos quarteirões de galpões abandonados no bairro do Ipiranga nem imagina que ali foram escritos alguns dos mais interessantes capítulos da história da indústria automobilística do Brasil.


 
A Fábrica da Vemag em seus tempos áureos (acima) e hoje (abaixo)
As instalações do Ipiranga poderiam ser protegidas pelo patrimônio histórico, tal sua importância para a história da indústria automobilística nacional
Muitas das imagens deste post foram obtidas no ótimo site São Paulo Antiga,
Vale a pena conferir!http://www.saopauloantiga.com.br/vemag-uma-fabrica-que-agoniza-no-tempo/Durante mais de uma década, ali ficava a fábrica da
VEMAG - Veículos e Máquinas Agrícolas S.A,
uma das pioneiras na produção de automóveis em nosso país,
uma empresa nacional que foi fundada em 1945 como
Distribuidora de Automóveis Studbaker Ltda,
e iniciou suas operações montando caminhões e tratores americanos.
 

Em 1956, com o incentivo governamental para a fabricação de automóveis no país, obteve licença para produzir no Brasil os modelos da DKW, uma das empresas do grupo alemão Auto Union, que era formado por 4 montadoras: DKW, Horsch, Wanderer e a emblemática Audi.

Logo da DKW, empresa que fazia parte da Auto Union, criada durante a Grande Depressão dos anos 30 Entre elas estava a Audi 


Os automóveis da DKW eram robustos e se adaptaram muito bem às péssimas condições de nossas ruas e estradas. Talvez tenha sido esta confiabilidade dos primeiros DKW que ajudou a formar a ótima imagem que os carros alemães tem no Brasil, e que foi consolidada com a chegada da 
Volkswagen.


Propaganda da Vemag de 1956, no lançamento de sua linha de automóveis

O DKW Belcar, o sonho de consumo de quem queria sair do Fusca Outra curiosidade sobre os modelos DKW era que funcionavam com motores "dois tempos", uma tecnologia que hoje está abandonada para automóveis, mas ainda é usada para motoserras, modelismo e aviões de pequeno porte, que precisam de motores mais leves com ótima relação peso x potência. 


O motor de 2 Tempos do DKW

Entre os motivos que levaram ao seu desuso está o fato de que poluem 30% mais do que um motor atual de 4 tempos e tem uma pior eficiência térmica. Outra desvantagem é que precisam receber óleo diretamente no tanque de combustível na proporção média de 1 para 40. A DKW contornou esta última questão com o desenvolvimento de um sistema próprio de lubrificação automática, chamado Lubrimat, que equipou seus carros no Brasil a partir de 1964. 

 
Propaganda da Perua Vemaguet 

Fissore, o modelo mais sofisticado da Vemag Um dos grandes feitos da Vemag foi ter batido o recorde brasileiro de velocidade, com o protótipo Carcará, que alcançou na BR-2 Rio Santos (atual Avenida das Américas, na Barra da Tijuca, onde hoje está um Supermercado Carrefour) a marca de 212,903 km/h.

Matéria da Revista Auto Esporte com o recorde do Carcará em 1966, válido até hoje.Com um design futurista e aerodinâmico projetado por Anísio Campos e um motor de apenas 1.000 cc, permanece até hoje como o recorde absoluto para automóveis 1.0.

 

O Carcará na Barra da Tijuca, andando pela Rio-Santos (hoje Avenidas das Américas)
Foi a primeira medição oficial de velocidade em reta feita no Brasil

Modelo computadorizado do Carcará Para mim, ele tem um quê de Match 5...
Vídeo do Programa Auto Esporte de 2006, comemorando 40 anos do feito do CarcaráAlém da experiência com o Carcará, a Vemag teve uma das mais importantes equipes de pilotos da década de 60.
 
Equipe Vemag, uma das mais respeitadas do país

Em seu auge, a Vemag tinha mais de 4.000 funcionários trabalhando na fábrica do Ipiranga (mais exatamente na Vila Carioca), e vestir "o macacão azul" de seus operários era o sonho de 9 entre 10 metalúrgicos (isto é até citado na biografia do Presidente Lula). A Vemag foi para a época um orgulho da indústria nacional, comparável ao que é hoje a Embraer. Durante os 11 anos em que operou, foram produzidos cerca de 115.000 automóveis. Foto aérea da Fábrica do Ipiranga nos anos 60. Mais de 4.000 funcionários 
Linha de produção do Fissore, também no bairro do Ipiranga Em 1967, a Volkswagen do Brasil anunciou a compra da Vemag, uma manobra até certo ponto esperada, pois a detentora da marca DKW, a Auto Union, havia sido vendida em 1964 para a Volks alemã, transformando-se em AUDI.
 
Anúncio polêmico veiculado na imprensa logo após o anúncio da compra da Vemag pela Volks, em 1967. Propaganda enganosa? Apesar das declarações de que a produção dos automóveis DKW seria mantida no Brasil, menos de 3 meses depois a fábrica da Vemag no Ipiranga interrompeu a produção de seus automóveis, e suas instalações passaram a abrigar a linha de produção da Kombi, mantendo grande parte dos operários, e transferindo para sua planta de São Bernardo do Campo parte de seu corpo administrativo.
Raio X do DKW Belcar 

Os proprietários de DKWs e seus admiradores reclamaram muito do presidente da empresa após a venda da Vemag para a Volks, e muitos nunca o perdoaram pela "traição", mas na versão de Lélio de Toledo Piza, a venda de sua empresa foi a salvação de milhares de empregos, e uma "jogada de mestre" para que os acionistas da VEMAG não perdessem todo o seu patrimônio.


Lélio de Toledo Piza (1913 - 2008) O homem que "enganou" a Volkswagen

Após a venda da Vemag para a Volkswagen em 1967 seu ex-presidente Lélio de Toledo Piza (1913-2008) foi nomeado para a presidência do Banespa. Em 1968, Lélio fez uma viagem à Florianópolis para visitar uma agência na capital catarinense. O funcionário destacado para buscá-lo no Aeroporto tinha adquirido uma Vemaguet 1967 0 Km na cor azul Tramandaí. Ao chegar na Vemaguet, Lélio ficou muito constrangido e deu um sorriso desconcertado. Já dentro da Vemaguet, Lélio tomou timidamente a iniciativa de começar uma conversa: - Bonita Vemaguet
Ao que respondeu o funcionário:
- Pois é, seu Lélio, eu acreditei na Vemag e comprei esta Vemaguet 0 Km recentemente, pouco tempo depois vocês venderam a Vemag para a Volks e prometeram que a fabricação do DKW continuaria. Agora, estou com um carro semi-novo desvalorizado que ninguém quer.
Lélio, vendo o inconformismo do proprietário pediu que ele encostasse o carro e contou uma versão até então desconhecida da história:
- Vou lhe contar o que houve, meu filho. Em 1964 fomos à Alemanha conversar com o presidente da Volkswagen alemã Heinz Nordholf, pois a Volks havia comprado o Grupo Auto Union, que foi quem nos deu a licença para produzir o DKW no Brasil por 10 anos. Chegando lá ele nos avisou que a produção do DKW seria encerrada na Alemanha e que a Volkswagen não renovaria a concessão para a Vemag, concessão esta que se encerrou no ano passado (1967). Ele nos ofereceu a concessão dos carros Audi, mas a Vemag estava muito endividada e os carros DKW já não vendiam tanto no Brasil, não tínhamos capital de giro para adequar o maquinário da fábrica para a fabricação dos Audi, portanto, a Vemag estava inviabilizada comercialmente. Daí num domingo de 1966 eu estava no Jóquei Clube de São Paulo onde também se encontrava o presidente da Volkswagen do Brasil. Circulando entre os convidados se encontrava um colunista social importante de São Paulo que veio me cumprimentar e me perguntou se eu tinha alguma novidade sobre o desfecho das negociações da Vemag com a Volkswagen. Eu respondi que as negociações com a Fiat estavam concluídas e que todo o parque industrial da Vemag a partir de 1967 passaria a produzir carros da FIAT sob o comando da montadora italiana. Na mesma hora a tal colunista foi contar ao presidente da Volks que ficou branco, pois eles tem muito medo que a FIAT se instale no Brasil e prejudique a hegemonia deles no mercado brasileiro. Na segunda-feira ele me ligou e chamou para uma conversa em que fez uma proposta irrecusável pela Vemag, pois com o montante pagaríamos todas as dívidas e ainda sairíamos com algum dinheiro para os acionistas da companhia. Se não tivesse feito isto, eles teriam feito uma proposta ridícula pela Vemag. Durante as negociações eles prometeram que por um período manteriam o DKW em linha no Brasil, bem como suas peças de reposição, mas infelizmente não honraram a palavra empenhada. Então, meu filho, foi isto que aconteceu.

Fábrica da Auto Union na Argentina, também comprada pela Volkswagen Os argentinos, porém, continuaram com peças de reposição.
Na Argentina a Volks adquiriu a subsidiária local que montava o DKW para produzir peças de reposição, mas no Brasil entregaram a terceiros a fabricação de peças do DKW, e devido à péssima qualidade, os DKWs desapareceram rapidamente das ruas brasileiras.

Catálogo de cores da Vemag Apesar dos esforços da Volks para impedir, a FIAT instalou-se em Betim, Minas Gerais na década de 70, e em 1977 lançou seu primeiro carro no Brasil, o Fiat 147, um sério concorrente do Fusca.
Lançamento do Fiat 147 no Brasil, em 1977 O maior pesadelo da Volks tornara-se realidade
Fazer este post sobre a Vemag foi muito especial para mim, pois meu pai, um imigrante espanhol que chegou ao Brasil em 1960 fugindo da pobreza e desemprego, conseguiu um emprego administrativo na Vemag. Quando a Volks adquiriu a empresa, ele não foi demitido, e sim transferido para a fábrica de São Bernardo do Campo, onde teve a oportunidade de trabalhar durante mais de 20 anos, ajudando a construir a história da montadora alemã no Brasil.


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